quinta-feira, 3 de maio de 2012

Fósseis incríveis

Encontrar um fóssil, qualquer que seja, já é um evento raro. São necessárias várias etapas para isso ocorrer:

1. O organismo morre;

2. Ele é depositado num local apropriado para fossilização (lago, âmbar, congelado, etc);

3. O local onde ele foi depositado ficou relativamente "estável" durante um tempo (alguns milhares de anos), permitindo todos os processos físicos e químicos que vão transformar os restos do organismo num fóssil;

4. Após fossilizar o fóssil (!), o ambiente deve resistir a diversos tipos de "catástrofes paleontológicas" (catástrofes naturais, intemperismo e erosão, derretimento por magma, ser destruído por raízes de plantas numa floresta, etc);

5. Resistindo durante milhares, milhões ou bilhões de anos, o fóssil deve ficar exposto parcialmente (através do desgaste contínuo da chuva, vento, maré, etc) para que alguém possa encontrá-lo;

6. Essa pessoa que encontrar o fóssil ser alguém que tenha alguma noção do que encontrou (ou um cientista ou alguém que conhece a existência de fósseis), para que o mesmo possa ser encaminhado para estudo e divulgação.

Só passando por todos esses passos é que um ser vivo antigo pode ser conhecido pelo mundo. Mesmo com toda essa dificuldade, nós conhecemos uma surpreendente variedade fóssil, principalmente de animais. Hoje vamos ver alguns fósseis que, além de passar por todas essas dificuldades citadas acima, ainda foram preservados em momentos raríssimos. São verdadeiras jóias da Paleontologia!

1. Os briguentos da Mongólia

Em 1971, um fóssil surpreendente foi descoberto, no deserto de Góbi, Mongólia (que, aliás, é um dos tesouros mundiais da paleontologia): um Velociraptor e um Protoceratops preservados bem no "meio" de uma briga! Olhando o fóssil, é indiscutível observar que eles estavam brigando: se vocês repararem bem, verão o bico córneo do Protoceratops mordendo o braço do raptor, enquanto que uma das garras do famoso dino carnívoro se encontra próxima ao pescoço do herbívoro. Uma das evidências de predação mais claras já encontradas, esse fóssil não deixa dúvidas sobre a interação ecológica entre esses animais.

Mas...como eles foram preservados nessa posição? Será que nenhum dos dois percebeu que estava para morrer e preferiu continuar brigando? Bem, o instinto básico de qualquer animal é a sobrevivência. Para os dois animais terem morrido juntos, brigando, um evento muito rápido deve ter ocorrido (ou uma tempestade de areia, ou um deslizamento próximo, ou algo do gênero), enterrando-os rapidamente antes que eles sequer "percebessem" o perigo que passavam.

O site do American Museum, em Nova York, possui três vídeos que retratam muito bem esse evento, um dos mais conhecidos da Paleontologia. Vale a pena dar uma olhada nesse link! (atenção: para visualizar os vídeos é necessário ter o programa "Quick Time" no computador)

2. A mamãe do mar











Os ictiossauros são répteis marinhos semelhantes à golfinhos e tubarões (são, inclusive, muito utilizados em exemplos didáticos de convergência evolutiva), cuja linhagem se encontra completamente extinta atualmente. Eles são impressionantes por diversos motivos: tamanho (alguns podiam alcançar mais de 20m), olhos (estão entre os maiores do reino animal), diversidade no mesozóico...mas, possivelmente, o que mais chama a atenção nesses bichos são os fósseis de seus fetos.
Um dos poucos exemplos fósseis de viviparidade (onde os animais dão a luz diretamente ao seus filhotes, sem passar pelo estágio de ovo), alguns fósseis de ictiossauros impressionam por registrar exatamente o momento mais mágico da natureza: a gestação e o parto. Existem alguns fósseis muito bem preservados de fetos de ictiossauros isolados, mas a imagem acima representa um dos fósseis mais famosos do mundo, com uma mamãe ictiossauro dando a luz a seu filhote. Infelizmente para ela, algum problema deve ter ocorrido na hora do parto (o filhote entalou? Houve muita perda de sangue? Algo os matou repentinamente?), entretanto, a fossilização naquele exato momento eternizou mãe e bebê ictiossauros dentro da história da Paleontologia.

3. O filhote congelado

A Sibéria não é conhecida somente pela propaganda da operadora Net ou pelo local onde o Hyoga, do desenho Cavaleiros do Zodíaco, teve seu treinamento. Lá é o local onde provavelmente se encontra a maior quantidade de mamutes congelados do mundo!

Os mamutes, parentes peludos dos elefantes, viveram até pouco tempo atrás (pouco tempo no sentido paleontólogico; para nós, que trabalhamos frequentemente com a ordem de milhões de anos, alguns milhares de anos são pouquíssimo tempo) e, por isso, podem ser encontrados com grande grau de preservação. Várias descobertas de mamutes congelados (parcial ou totalmente) já foram noticiadas, mas uma delas teve especial destaque na mídia.

Apelidado de Lyuba, o pequeno filhote de mamute da foto acima (com aproximadamente um mês de vida) foi encontrado por uma família de pastores de rena siberianos em um estado incrível de preservação (olhando para o fóssil, nem dá para perceber que ele tem 40 mil anos de idade). O chefe da família contactou as autoridades locais, que encaminharam uma equipe de pesquisa ao local. O fóssil foi recolhido e estudado por cientistas europeus e japoneses, numa incrível descoberta que ajudou muito na compreensão acerca desses incríveis animais extintos. O site da revista National Geographic fez a cobertura da descoberta e possui uma belíssima galeria de imagens de Lyuba aqui. Confiram!

4. Esqueceu de dar a descarga

Muitos fósseis "bizarros" já foram encontrados na história: animais estranhos, plantas esquisitas, microorganismos que parecem "alienígenas". Mas poucos fósseis são mais surpreendentes do que dejetos de dinossauros! Apresento à vocês um urólito, isso mesmo, uma marca de xixi fossilizado de dinossauro:

Esse fóssil brasileiro, vindo de Araraquara (interior de SP), foi descrito pelo paleontólogo Marcelo Adorna Fernandes em 2004 e representa uma possível marca de urina, deixada provavelmente por um dinossauro no lugar onde, há milhões de anos, era uma imenso deserto. O material, incluvise, é muito parecido com a marca que deixam os avestruzes na terra quando fazem suas necessidades. Dado o parentesco entre dinossauros e aves, é razoável supor que este fóssil tenha sido deixado por um dinossauro que quis se "aliviar" há milhões de anos.

O urólito, que veio do mesmo lugar de onde surgem diversos fósseis de pegadas, estava exposto na exposição "Dinos-na-Oca" (2006), realizada em São Paulo. Alguém aí se lembra da exposição e desse fóssil?


Enfim, caros leitores, esses foram apenas quatro dos mais fascinantes fósseis já encontrados no mundo. Muitos outros são igualmente impressionantes (dinos mumificados, pele fossilizada, órgãos, tecidos moles e até vasos sanguíneos preservados em rocha, entre muitos outros), mas quis mostrar estes quatro em especial no post de hoje. Espero que vocês tenham gostado e até a próxima!